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Pandemia, saúde e reflexões

Arte – a melhor terapia para a saúde
Contexto da gripe espanhola (1918-1919)

Faz todo o sentido falar em Saúde nos tempos atuais. Esta tornou-se a nossa maior preocupação. Reavivamos hoje memórias de um passado coletivo que ficou gravado nos arquivos da mente humana. Ressuscitam agora através dos inúmeros testemunhos que em diversas épocas e contextos nos deixaram os sobreviventes de outras pandemias. 

Por essa razão, e porque no meu livro “Hipnose, o Regresso ao Passado” existe uma alusão ao confronto entre a medicina convencional e as medicinas alternativas, irei usar este espaço do blogue para explorar traços da História sobre a Saúde das populações ao longo dos séculos.

Mas será que os comportamentos também mudaram assim tanto ao longo do tempo? Ou estaremos nós esquecidos de que somos mortais perante as doenças, e não apenas vulneráveis às guerras?

Quem pensou que no ano de 2020 teríamos que lutar para sobreviver a um vírus?

A Covid-19 e a gripe espanhola

Na sua relação com a Covid-19, muito se tem especulado acerca das semelhanças da atual Pandemia com a gripe espanhola (também conhecida como gripe pneumónica ou “Influenza”), de 1918-1919. Em ambos os casos, há um profundo impacto económico e social nas comunidades.

Aliás, a gripe que mataria (estima-se hoje) à volta de 100 milhões de pessoas durante os anos de 1918 e 1919, foi eclipsada dos anais da História, num mundo devastado pela I Guerra Mundial. Muitas das mortes atribuídas à guerra, foram-no por influência, direta ou indireta, desta pandemia global, que terá surgido pela primeira vez (embora existam diferentes teorias) na base militar de Fort Riley, nos Estados Unidos.

Contudo, a verdadeira causa e natureza dos acontecimentos globais apenas encontram uma explicação fundamentada e objetiva, à luz dos progressos tecnológicos e científicos.

A identificação do vírus com o subtipo H1N1 do Influenza A (responsável pela gripe espanhola) só foi possível na década de 1930, razão pela qual não foi desenvolvida qualquer vacina até ao término da pandemia, em 1919. Tal como aconteceu com a Covid-19, não existia naquela época uma vacina disponível durante o período mais crítico.

Por outro lado, tal como hoje, coexistiam outras epidemias que se alastravam em simultâneo, sobretudo os surtos sazonais de gripe, o que dificultava não apenas a identificação da doença, mas também a contagem dos mortos e infetados pela “Influenza”.

São muito semelhantes as ilações que temos a retirar entre a gripe espanhola e a pandemia de Covid-19. Em ambos os casos, estamos perante uma nova doença em circulação: não existe imunização das populações, sendo necessário produzir uma vacina.

Novas regras de higienização e socialização: as lições da História

Ao rever alguns dos aspetos históricos da “Influenza”, fiquei surpreendida com as semelhanças existentes entre as regras de controlo da doença aplicáveis no início do século XX e as atuais, relativamente à Covid-19.

É, por isso, que acho tão importante conhecermos os contornos históricos dos acontecimentos. O presente só adquire sentido em confronto com o passado, que pode ou não justificá-lo, mas que o enquadra e define. Às vezes, estas duas realidades, o passado e a modernidade, estão mais próximas do que aquilo que se possa pensar.

É preciso salientar que a Primeira Guerra Mundial ajudou à rápida propagação da gripe pneumónica, que se revelou altamente contagiosa. Apesar de não vivermos hoje em dia numa guerra a uma escala planetária, existem outros fenómenos de disseminação das doenças, como a globalização. Passados 100 anos, desde a pandemia de 1918, voltamos a ter que conviver com uma nova doença. Desta vez, com a agravante de uma muito mais rápida disseminação. De facto, num mundo cada vez mais interligado entre si, também a rapidez na propagação das doenças é bem maior.

Mas, afinal, que medidas foram tomadas em 1918 para controlar a gripe pneumónica?
Aqui segue uma lista delas, que nos deixarão a todos surpreendidos pela sua semelhança com as que são hoje aplicadas para controlar a Covid-19 em vários países:

Lavagem frequente das mãos.
Tapar a boca com um lenço ao espirrar.
Uso generalizado de máscaras forradas com várias camadas de gaze.
Restrições no acesso aos transportes públicos.
Proibição de ajuntamentos, multidões e manifestações.
Encerramento de escolas e templos religiosos.
Criação de alas de isolamento nos hospitais para os infetados e implementação de cercas sanitárias nas cidades.

É interessante notar como no ano de 1918, sem os conhecimentos médicos e científicos dos nossos dias, já existiam práticas recorrentes de profilaxia, mesmo sem se saber qual era o agente patogénico que causava as doenças.

Este é um aspeto que eu gostaria de destacar neste artigo: existe no ser humano um instinto que o leva a adotar certas medidas, que a ciência vem mais tarde a comprovar como sendo as mais ajustadas, ainda que desconhecendo os agentes patogénicos causadores.

Só para vos dar um exemplo, foi neste período que se generalizou no Japão o uso da máscara, sem que fossem ainda conhecidos os seus benefícios para a contenção da gripe pneumónica. Penso que tudo isto dá que pensar!

A gripe e as artes

O Homem age por instinto. E foi através do instinto que os seres humanos tentaram sobreviver às maiores privações, sobretudo às doenças. Foi o que se passou em relação à gripe espanhola, e o mesmo se passa agora em relação à pandemia de Covid-19.

Como já devem ter reparado, decidi dedicar um espaço no meu blogue à Saúde e às Artes. Por isso, gostava de referir o impacto da gripe pneumónica no mundo das artes à data de 1918.

Desde logo, a morte de artistas reputados e de outras personalidades com importantes funções sociais. Para aqueles que sobreviveram, a gripe espanhola teve um efeito traumático, do qual a arte deu testemunho através de múltiplas manifestações e géneros artísticos. 

O exemplo do romance “A Peste” de Albert Camus.

Camus tentou demonstrar como uma pandemia consegue colocar à prova a natureza do ser humano. Ainda que o livro tenha sido publicado várias décadas após a gripe espanhola, em 1947, a verdade é que ainda se sentia na sociedade os efeitos desta doença. E o escritor foi sensível a este sentimento, traduzindo isso para a Arte.

Nascido em 1913, Camus era muito novo aquando do aparecimento da gripe pneumónica. Apesar disso, o seu romance demonstra que a sociedade manteve as feridas e mágoas do acontecimento durante várias décadas. Feridas essas que vieram a ser contadas através do poder das palavras.

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